Fazendo, Cumprindo e Quebrando Promessas


(O que se segue é uma correspondência de e-mail editada)

Eu tenho uma pergunta com respeito ao que a Bíblia diz sobre promessas, como por exemplo, o que devemos fazer com promessas que fizemos antes de nos tornarmos cristãos, etc.

Aqui estão vários princípios bíblicos:

1. Não faça promessas imprudentes ou desnecessárias.
2. Se você fizer uma promessa, cumpra-a.
3. Se a promessa que você fez for desvantajosa para você, você ainda deve cumpri-lá (Salmos 15:4).

Os princípios acima são suficientes para cobrir muitos casos, se não a maioria. Mas há outros princípios bíblicos que cobrem situações e condições adicionais:


4. Pode haver uma pessoa que esteja acima de você em autoridade, que tenha o direito de impedi-lo de fazer uma determinada promessa, ou anulá-la mesmo após ela ter sido feita.
5. Se uma promessa viola a Palavra de Deus (de forma que você não deveria têla feito de forma alguma), então, dependendo da natureza da promessa e de outros fatores relevantes, pode haver ocasiões em que você ainda terá que cumpri-lá, enquanto que em outras ocasiões você estará estritamente proibido de cumpri-la.
Muitas pessoas já conhecem os princípios 1-3 e suas bases bíblicas, de forma que elaborarei somente os princípios 4 e 5.

Algumas passagens na Bíblia têm o objetivo de serem “leis da causa”, similares à idéia de “precedência” em nosso sistema legal, de forma que suas aplicações não são limitadas ao contexto imediato; antes, elas apresentam os princípios sobre os quais casos similares devem ser julgados.

Por exemplo, Paulo usa a lei “Não amordace o boi” como algo semelhante a uma lei da causa e ensina a partir dela o direito de um ministro receber dinheiro daqueles a quem ele ministra:

Quem serve como soldado às suas próprias custas? Quem planta uma vinha e não come do seu fruto? Quem apascenta um rebanho e não bebe do seu leite? Não digo isso do ponto de vista meramente humano; a Lei não diz a mesma coisa? Pois está escrito na Lei de Moisés: “Não amordace o boi enquanto está pisando o grão”. Por acaso é com bois que Deus está preocupado? Não é certamente por nossa causa que ele o diz? Sim, isso foi escrito em nosso favor. Porque “o lavrador quando ara e o debulhador quando debulha, devem fazê-lo na esperança de participar da colheita”. Se entre vocês semeamos coisas espirituais, seria demais colhermos de vocês coisas materiais? (1 Coríntios 9:7–11, NVI)

Quando diz respeito ao princípio 4, o qual é raramente ensinado, uma das passagens mais relevantes é Números 30:1-16. Lemos assim:

Moisés disse aos chefes das tribos de Israel: “É isto que o SENHOR ordena: Quando um homem fizer um voto ao SENHOR ou um juramento que o obrigar a algum compromisso, não poderá quebrar a sua palavra, mas terá que cumprir tudo o que disse.

“Quando uma moça que ainda vive na casa de seu pai fizer um voto ao SENHOR ou obrigar-se por um compromisso e seu pai souber do voto ou compromisso, mas nada lhe disser, então todos os votos e cada um dos compromissos pelos quais se obrigou serão válidos. Mas, se o pai a proibir quando souber do voto, nenhum dos votos ou dos compromissos pelos quais se obrigou será válido; o SENHOR a livrará porque o seu pai a proibiu.

“Se ela se casar depois de fazer um voto ou depois de seus lábios proferirem uma promessa precipitada pela qual se obriga a si mesma e o seu marido o souber, mas nada lhe disser no dia em que ficar sabendo, então os seus votos ou compromissos pelos quais ela se obrigou serão válidos. Mas, se o seu marido a proibir quando o souber, anulará o voto que a obriga ou a promessa precipitada pela qual ela se obrigou, e o SENHOR a livrará.

“Qualquer voto ou compromisso assumido por uma viúva ou por uma mulher divorciada será válido”.

“Se uma mulher que vive com o seu marido fizer um voto ou obrigar-se por juramento a um compromisso e o seu marido o souber, mas nada lhe disser e não a proibir, então todos os votos ou compromissos pelos quais ela se obrigou serão válidos. Mas, se o seu marido os anular quando deles souber, então nenhum dos votos ou compromissos que saíram de seus lábios será válido. Seu marido os anulou, e o SENHOR a livrará. O marido poderá confirmar ou anular qualquer voto ou qualquer compromisso que a obrigue a humilhar-se. Mas, se o marido nada lhe disser a respeito disso até o dia seguinte, com isso confirma todos os seus votos ou compromissos pelos quais se obrigou. Ele os confirma por nada lhe dizer quando os ouviu. Se, contudo, ele os anular algum tempo depois de ouvi-los, ele sofrerá as conseqüências de sua iniqüidade”.

“São essas as ordenanças que o SENHOR deu a Moisés a respeito do relacionamento entre um homem e sua mulher, e entre um pai e sua filha moça que ainda vive na casa do pai”.

Isso é diretamente aplicável aos cristãos. E embora o contexto imediato se refira a “um voto ao SENHOR”, os princípios se aplicam a todos os tipos de promessas, visto que a passagem inteira é um mandamento de Deus “a respeito do relacionamento entre um homem e sua mulher, e entre um pai e sua filha moça que ainda vive na casa do pai”. Assim, não somente ela é aplicável, mas ela é ainda mais obviamente aplicável do que algumas das leis de caso.

(Concernente à aplicabilidade da lei do Antigo Testamento, por favor, leia meu Commentary on Ephesians e The Sermon on the Mount. E para uma estrutura de autoridade no lar, por favor, leia meu Commentary on Ephesians e Renewing the Mind).

Apliquemos o exposto acima a um exemplo.

Suponhamos um parente ou um amigo de uma mulher casada que queria tomar dinheiro emprestado. A mulher não tem o direito de prometer um empréstimo sem antes perguntar ao seu marido. Se a mulher, contudo, promete o empréstimo e seu marido está presente, então, ele tem o direito de imediatamente anular a promessa. O marido não terá pecado por anular a promessa feita ilegitimamente pela esposa, e a esposa não terá pecado por reter o empréstimo que ela tinha inicialmente prometido, visto que a promessa foi anulada pelo marido. Todavia, a esposa deveras teria pecado fazendo a promessa sem perguntar ao seu marido. Agora, se a mulher promete o empréstimo e o marido não está presente, então, ele tem o direito de anular a promessa logo que ouvir sobre ela, e o resto é o mesmo.

Mas quer o marido esteja ou não presente quando a mulher faz a promessa, se ele não disser nada assim que ouvir sobre ela, então, é como se ele tivesse dado a sua aprovação e confirmado a promessa. Tanto o marido como a esposa são então moralmente obrigados a fazer cumprir a promessa e conceder o empréstimo. Contudo, se o marido mudar de idéia e decidir reter o empréstimo uma vez que ele tenha explicitamente ou implicitamente confirmado a promessa, então ele comete pecado, e é como se ele tivesse pessoalmente feito e então quebrado a promessa. Nesse caso (isto é, quando o marido muda de idéia após confirmar a promessa), a esposa deverá obedecer o marido e reter o empréstimo ela não peca fazendo isso, mas a culpa cai sobre o seu marido. Por outro lado, se a esposa decide fazer cumprir a promessa mesmo após o marido ter mudado de idéia, então ambos, o marido e a esposa, cometem pecado ele peca quebrando a promessa, e ela peca desobedecendo ao seu marido.

Quanto ao marido, ele tem o direito de prometer o empréstimo sem discutir o mesmo com sua esposa; contudo, como resultado do seu amor e respeito por sua esposa, para proteger a confiança e intimidade do relacionamento matrimonial, e para manter a ordem no lar, seria sábio para ele discutir com sua esposa de qualquer forma, e ele deveria usualmente (praticamente sempre) fazer a promessa somente se ambos concordarem com ela. Todavia, a decisão final sempre descansará com o marido.

Certamente, os feministas não gostam disso, mas eu não gosto dos feministas, assim, estamos empatados. Mas eu ainda estou correto.

Note não somente a tremenda autoridade do marido, mas também a tremenda responsabilidade que é colocada sobre ele. Está sobre ele a avaliação se a família pode ou não ter recursos para oferecer o empréstimo, assim como determinar todas as conseqüências espirituais, sociais e financeiras de fazer a promessa. Quer ele pense ou não que é uma boa idéia (e especialmente se ele pensar que não é uma boa idéia), se ele aprova e confirma a promessa feita pela esposa (ou se ele é o único que faz a promessa), e então, se dificuldades severas assolam a família por causa do empréstimo visto que o dinheiro necessário não está disponível então, assumindo que não há justificação moral para fazer a família passar por tal dificuldade, a culpa novamente cai sobre o marido, não sobre a esposa.

É verdade que algumas esposas são melhores do que os seus maridos para analisar a situação financeira da família. Em tais casos, os maridos devem reconhecer isso, e discutir o assunto com suas esposas, e então fazer sua decisão. Mas quer eles façam ou não isso, eles devem tomar a decisão final e assumir a responsabilidade moral por ela. Eles são aqueles com a maior autoridade no lar, mas eles são também aqueles que são os mais responsáveis pelo que acontece na e às suas famílias.

Nós temos usado o relacionamento matrimonial e o empréstimo como um exemplo, mas o princípio se aplica também ao relacionamento entre um pai e uma filha, e com respeito a outros tipos de votos e promessas.

Além disso, note que embora tenhamos usado o exemplo para ilustrar o princípio 4, essa passagem [de Números 30] também trata de outros indivíduos e relacionamentos, tais como um homem, uma viúva e uma mulher divorciada. Uma exposição completa da passagem não deveria negligenciar esses.

O princípio 5 é fácil de explicar e ilustrar.

Quando chegamos ao que a Escritura ensina sobre promessas, uma das principais questões que as pessoas desejam resolver é esta: é verdade, como alguém inicialmente tende a assumir, que você sempre deve cumprir toda promessa que você fizer, não importa qual seja? A resposta é não, pois algumas promessas são anuladas por uma autoridade maior, e algumas são moralmente erradas para se cumprir.

Contudo, isso não significa automaticamente que você não tenha pecado numa situação onde você deve quebrar uma promessa. Em muitos casos, você já pecou ao fazer a promessa; você apenas cometerá outro pecado se cumprir a promessa, e você não pode desfazer um pecado cometendo outro.

Por exemplo, se por alguma razão eu lhe prometer roubar um banco para você ou assassinar alguém para você, então, certamente, eu não devo cumprir essa promessa. Eu já pequei em fazer tal promessa, e seria um pecado ainda maior cumpri-la.

Ou, se você faz uma promessa a alguém em nome de sua companhia, quando você não tem autoridade para fazer tal promessa, então, você já agiu erroneamente ao fazer a promessa, mas também seria errado cumprir uma promessa que você não tinha o direito de fazer. Nesse caso, a companhia tem o direito de decidir se você pode ou não cumprir a promessa. De fato, para proteger sua reputação, que você agora colocou em risco, ela pode honrar sua promessa ilegítima de qualquer forma, mas certamente ela não seria obrigada a assim fazer. Em alguns casos, e quando possível, a coisa certa a fazer pode ser honrar a promessa com os seus recursos pessoais.

Deus sempre tem o direito de decidir sobre todas as promessas. Secundariamente, algumas figuras humanas de autoridade podem ter direitos sobre as suas promessas, tais como pais, maridos, pais, pastores e empregadores.

Todavia, isso não quer dizer que você deva sempre quebrar todas as promessas que você não tinha o direito de fazer. Por exemplo, o fato de você, como um cristão, casar com uma incrédula, seria um grande pecado, mas seria outro grande pecado para você o se divorciar da incrédula, uma vez que você tenha se casado com ela. Isso é porque embora Deus tenha declarado, através dos Seus preceitos, que Ele se opõe a esse casamento pecaminoso, é ainda o mesmo Deus que o inspeciona, e o que Ele uniu, que nenhum homem separe (1 Coríntios 7:12-13; veja também The Sermon on the Mount).

Há princípios aplicáveis na Escritura a toda situação que você enfrentar, e para cada promessa que você fizer. Eles te dirão o que é certo e o que é errado em cada ocasião, e mesmo quando você tiver agido errado, eles lhes dirão o próximo passo a seguir.

Nossa discussão sobre os princípios 4 e 5 não deve complicar as coisas ao ponto dos princípios 1-3 se tornarem obscuros. De fato, os princípios 1 e 2 seriam suficientes para guiar a maioria das suas decisões sobre fazer e cumprir promessas isto é, não faça promessas imprudentes ou desnecessárias (muitas promesas são desnecessárias se você pretender fazer algo, apenas faça), mas uma vez que você tenha feito uma promessa, cumpra-a. Há exceções, mas exceções são raras, embora elas possam acontecer. Certamente, então, a melhor coisa a fazer é evitar fazer promessas que você não tenha o direito de fazer, ou que você não possa ou não deva cumprir.

Então, algumas promessas podem não ser completamente pecaminosas, mas elas não são sábias, e a Bíblia diz que você deve implorar para ser liberto delas. Um exemplo é quando você é o fiador do empréstimo de alguém:
Meu filho, se você serviu de fiador do seu próximo, se, com um aperto de mãos, empenhou-se por um estranho e caiu na armadilha das palavras que você mesmo disse, está prisioneiro do que falou. Então, meu filho, uma vez que você caiu nas mãos do seu próximo, vá e humilhe-se; insista, incomode o seu próximo! Não se entregue ao sono, não procure descansar. Livre-se como a gazela se livra do caçador, como a ave do laço que a pode prender. (Provérbios 6:1–5)
Antes dele se aposentar, a profissão do meu pai mexia muito com contratos, documentos e suas ramificações. E desde que eu tinha uns poucos anos de idade, ele repetidamente me dizia que eu nunca deveria afiançar o empréstimo de ninguém.

Ele estava falando por experiência, mas a Escritura é o único guia verdadeiro e confiável. Todavia, nesse caso, meu pai fez algo que era escriturístico, a saber, ele me ensinou esse princípio correto (e que parece para muitos um princípio “adulto”) desde a minha tenra idade. Em Provérbios, o escritor está ensinando seu filho algumas das lições básicas da vida, e essa é uma delas nunca afiance o empréstimo de alguém, e se você já tiver feito, implore para sair dele.

Nunca é muito cedo para advertir seus filhos contra embriaguez, adultério, fiança, e outras coisas que os incrédulos e os crentes irresponsáveis consideram como lições “adultas”. Comece a ensinar essas coisas a seus filhos quando eles tiverem três ou quatro anos, e repita-as um par de vezes a cada mês até que eles deixam o lar como adultos, e isso só pode se afixar neles.

Em todo caso, de agora em diante você nunca deve estar numa situação onde você precise ser liberto de uma garantia, pois porque você sequer consideraria ser fiador de alguém após ler essa passagem? Apenas não seja. E se você insistir em ser, então esteja preparado para pagar a coisa toda, pois você aprisionou a si mesmo, e sua família com você.

Fonte: Monergismo
Autor: Vincent Cheung